Por Dr. Fernando Graça Aranha – CRM-SC 12033 – Coordenador da UTI do Hospital SOS Cárdio

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é um caminho para a vida. Aquela noção de que era um estágio final antes da morte, felizmente, é coisa do passado.

Antes de falarmos dos avanços que proporcionam cada vez mais segurança às pessoas internadas em UTIs e aos seus familiares, vamos voltar um pouco no tempo para explicar a forte e positiva mudança na terapia intensiva.

Evolução das Unidades de Terapia Intensiva – UTIs

As UTIs surgiram na segunda metade do século passado, como suporte pós-operatório para pessoas que eram submetidas a cirurgias grandes. Lá, recebiam assistência na recuperação da anestesia, da respiração artificial, entre outras coisas.

Mais tarde, as UTIs passaram a receber os pacientes clínicos, com infarto e outras doenças graves. Para se ter uma ideia, até as décadas de 1960 e 1970, muitas pessoas com infarto não ficavam no hospital. Eram tratadas em casa. Mas como se observou que morriam por arritmia – distúrbios elétricos que acontecem nas primeiras horas do infarto e são reversíveis – foi constatada a necessidade de ficarem mais tempo internadas e monitorizadas. Isso já ajudou a salvar muitas vidas. A primeira mudança na curva de mortalidade por infarto foi com o advento das unidades coronarianas. Nessa época, muitos hospitais no mundo e no Brasil começaram a organizar UTIs como se fossem enfermarias, só que com mais vigilância.

A partir da década de 1980, a evolução foi muito grande. Alguns médicos passaram a se especializar na terapia intensiva. As UTIs se transformaram em um centro modificador nos hospitais. Muitas das mudanças de qualidade que começaram a surgir nos hospitais, a partir dos anos de 1990, vieram das UTIs. Exatamente pela maior vigilância, segurança e pelos protocolos seguidos.

Atualmente, as UTIs melhoraram muito. Além do avanço da tecnologia, existe a superespecialidade dos profissionais, os protocolos a serem seguidos rigorosamente, a preocupação com os indicadores e a medição dos resultados. Ou seja, hoje, as UTIs precisam medir o seu próprio desempenho com escores e prognósticos.

Quem precisa ir para a UTI?

Existem as pessoas que vão para a Unidade de Terapia Intensiva – UTI de forma programada. São os casos das cirurgias cardíacas, pois chegam na UTI ainda com respiração artificial, instabilidade hemodinâmica – pressão alterada, diurese inadequada, pulmões ainda sofrendo o efeito da cirurgia. Isso pode durar alguns dias. E, claro, a necessidade de um cuidado mais próximo é maior.

Há também as pessoas que não esperam ter esse tipo de internação. São os pacientes clínicos com problemas graves o suficiente para demandarem esse cuidado mais próximo – e ir para a Unidade de Terapia Intensiva – UTI. Entram aí os casos de infarto, arritmias, insuficiência respiratória e septicemia (infecção generalizada). Essas pessoas e suas famílias sofrem um maior impacto psicológico, por não esperarem chegar a este ponto, de demandar a terapia intensiva. No entanto, a experiência mostra que a maioria absoluta dos pacientes clínicos graves se recupera para a vida graças à UTI. A mortalidade é muito baixa.

Importância da presença da família na UTI

Uma das mudanças importantes nas UTIs é a flexibilização para permitir a presença de familiares. Antes, as pessoas não podiam entrar por medo de infecção. Hoje, se sabe que o problema das infecções hospitalares são os germes resistentes que podem estar no próprio paciente, usualmente no intestino e não os que são trazidos de fora. Há, lógico, uma série de medidas fundamentais de higiene com os visitantes, como a limpeza das mãos, por exemplo. No entanto, a rigor, a recomendação é de que os familiares podem entrar com as roupas que vêm da rua.

Com isso, existe a tendência de permissão de visitas estendidas pelos familiares aos pacientes internados em UTI. Essa iniciativa acontece quando entendemos que a pessoa vai se beneficiar com a presença do familiar – porque está ansioso ou mesmo para prevenir que fique ansioso. Nesses casos, é importante que a família tenha uma estrutura emocional boa para ajudar, trazendo só coisas positivas. A avaliação é feita por profissionais de Psicologia, Medicina e Enfermagem. São vários os tipos de visita estendida na UTI. Às vezes, a família pode estar presente 24 horas.

Essa é uma novidade e uma tendência mundial. O resultado é ótimo e faz muita diferença para uma melhor recuperação do paciente que está na UTI. Além disso, os boletins médicos diários são também uma prática adotada para dar notícias sobre a evolução dos pacientes para os seus familiares. Nesses boletins, o médico da UTI vai diretamente falar com cada família. Em casos específicos, psicólogos e enfermeiros também participam e oferecem suporte aos familiares. Esse contato mais humanizado é fundamental.

Tecnologia e a Nova Tendência em UTI

A Medicina passa por uma grande mudança, que será ainda mais significativa nos próximos anos. Isso ocorre pela avanço da tecnologia e da inteligência artificial. Tudo já está melhor devido aos protocolos rigorosos, que diminuem os erros. Você já se perguntou por que caem tão poucos aviões por causas técnicas? É pela automação, pelo enrijecimento dos protocolos de segurança. Essa lógica cada vez mais faz parte da Medicina. Por isso, atualmente existe a tendência de se trazer para o ambiente hospitalar tudo o que houver de automação e de tecnologia para diminuir os erros.

Na Unidade de Terapia Intensiva, os indicadores de qualidade já são mais de cem. Um exemplo muito simples: o uso da aspirina no infarto. Toda pessoa que é internada com infarto precisa tomar aspirina, medicamento que diminui a mortalidade, se for usada nas primeiras 24 horas. Hospitais que atendem infarto devem medir este indicador e ter como meta 100% de acerto. Quer dizer, não devem ter paciente com infarto sem tomar aspirina, a não ser em casos excepcionais, de algum impedimento. Em hospitais especializados, chega-se praticamente a 100% de prescrição. Em hospitais gerais, não especializados, 20 a 25% dos pacientes com infarto ficam sem aspirina.

Nestes casos, quem prescreve a aspirina é uma pessoa, sujeita a erros. A tendência é justamente evitar que esses erros aconteçam. E isso só funciona com automação. A cada pessoa que internar com infarto, um sistema simples pode informar ao profissional responsável que ele precisa prescrever a aspirina. Ou detectar que não foi prescrita. Isso vai evitar o problema e não apenas colocá-lo em uma estatística. Como este exemplo, muitos outros virão em breve. São medidas que partem das UTIs e impactam no sistema hospitalar.

A humanização das UTIs, a flexibilização na participação dos familiares e a automação e a tecnologia vem colaborando para diminuir o receio tão comum de anos atrás. A Unidade de Terapia Intensiva é um caminho para a vida.

Dr. Fernando Graça Aranha é formado em Medicina na UERJ, em 1990, onde concluiu também Residência Médica em Cardiologia, em 1994. Possui MBA em Gestão em Saúde, pela FGV-RJ e Título de Especialista em Cardiologia pela SBC e em Medicina Intensiva pela AMIB.

Para saber quais são as principais orientações sobre cirurgias cardíacas, faça o download da nossa cartilha Pré e Pós-Operatório da Cirurgia Cardíaca:

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