Válvula Mecânica ou Biológica: qual a mais adequada?

Válvula Mecânica ou Biológica: qual a mais adequada?

A opção entre válvula mecânica ou biológica é uma das principais dúvidas das pessoas que recebem a indicação de uma cirurgia cardíaca para troca de válvula do coração. Atualmente, são realizadas, aproximadamente 280 mil cirurgias para implantação de prótese valvar por ano no mundo, de acordo com a Scientific Eletronic Library Online (Scielo).

Neste post, vamos abordar alguns critérios que são analisados no momento da escolha. A decisão deve ser amplamente conversada com o Cardiologista Clínico e o Cirurgião Cardiovascular. Os médicos terão condições de avaliar cada caso em particular e de orientar o paciente sobre a melhor prótese valvar para o seu caso.

Qual é a melhor válvula cardíaca: mecânica ou biológica?

O cirurgião cardiovascular Dr. Sérgio Lima de Almeida (CRM-SC 4370/RQE 5893), chefe da equipe Seu Cardio, de Cirurgia Cardiovascular em Florianópolis/SC, explica os tipos de próteses:

“Podemos dizer que, se existem dois tipos de próteses valvares para se escolher, é porque cada tipo atende a uma necessidade em especial. Assim, não há um tipo de válvula cardíaca melhor ou pior. No entanto, há aquele que se adequa melhor ao estilo de vida e às condições clínicas de cada pessoa. Dessa forma, devemos pensar em optar pela válvula cardíaca que irá atender às características pessoais a longo prazo. E essa decisão não é exclusiva do médico. A escolha da prótese valvar depende do hábito de vida do paciente e, até mesmo, de sua disciplina.” –  Dr. Sérgio Lima de Almeida (CRM-SC 4370/RQE 5893), Cirurgião Cardiovascular. 

A grande diferença entre as próteses de válvula mecânica ou biológica está no tipo de material com a qual são feitas. As válvulas mecânicas são feitas de metal, enquanto que as biológicas, na maioria das vezes, são de tecido de porco ou de boi. Quando se fala isso, a primeira reação é se perguntar sobre o risco de rejeição da prótese. Porém, o tecido utilizado é inerte, eliminando o risco de rejeição.

Prós e Contras de Cada Tipo de Válvula Cardíaca

Durabilidade das Próteses Valvares

O impacto dessa diferença entre as válvulas mecânicas e as válvulas biológicas está centrado na necessidade de uma futura reoperação. As válvulas mecânicas tem uma durabilidade longa, normalmente a vida inteira. Por outro lado, as válvulas biológicas, de uma maneira geral, precisam ser trocadas um dia. Elas degeneram e levam o paciente a precisar de uma nova cirurgia para a troca da prótese valvar no futuro.

Aí surge outra questão: alguém escolhe prótese biológica para operar de novo? Sim, pois este não é o único critério que define a opção entre válvula mecânica ou biológica.

Medicação Anticoagulante 

A prótese mecânica, por ser de metal, requer o uso de medicação anticoagulante de uso contínuo. E isso cria uma condição que o paciente não tem: torna o seu sangue pouco coagulável.

A necessidade da anticoagulação associada às próteses mecânicas se deve ao fato de que elas tendem a formar coágulos. Caso surjam, há o risco de travamento do disco da prótese e de embolia cerebral. Por isso, a disciplina do paciente e seu comprometimento com o tratamento são fundamentais, tanto em relação à tomar a medicação anticoagulante quanto realizar o controle de TAP. Até mesmo seu estilo de vida precisa ser levado em conta, devido aos riscos desse tipo de medicação. 

Por isso, pessoas que praticam esportes radicais ou cuja profissão pode acarretar acidentes, como o caso de caminhoneiros, por exemplo, devem avaliar bem essa questão.

Idade

Antes de abordarmos qual a melhor escolha para cada pessoa, precisamos considerar, ainda, que a idade é também um critério a ser considerado. 

“No caso das válvulas biológicas, quanto mais jovem for o indivíduo, menos elas duram; quanto mais idosa, mais elas duram. Por isso, a idade é mais um fator a ser considerado na opção entre válvula mecânica ou válvula biológica.” – Dr. Sérgio Lima de Almeida (CRM-SC 4370/RQE 5893).

 

A idade e a decisão entre válvula mecânica ou biológica

Em geral, pela necessidade de troca futura das válvulas biológicas, há uma tendência maior de uso das válvulas mecânicas entre os mais jovens. Logicamente, lembrando que este não é um critério a ser avaliado isoladamente, como apresentado acima.

Qual a melhor prótese valvar para jovens?

válvula mecânica ou biológica

Válvula Mecânica

Como exemplo, podemos considerar o caso de utilização de válvula biológica em posição aórtica. A sua durabilidade média é de oito a dez 8 a 10 anos, em um paciente de 35 anos de idade. Aos 65 anos, esta pessoa poderá estar indo para a sua terceira cirurgia cardíaca, para a troca de válvula. Nesses casos, o melhor é colocar uma prótese mecânica, caso não exista uma contraindicação formal à anticoagulação.

Esta tendência pode vir a mudar nos próximos anos, com o advento das válvulas implantáveis percutaneamente. Dessa forma, se consegue o implante de uma válvula dentro de outra (biológica) já previamente implantada (valve in valve).

 

Qual a melhor prótese valvar para idosos?

válvula mecânica ou biológica

Prótese Válvula Biológica

Já para as pessoas com mais de 65 anos, há uma tendência maior de colocação de prótese biológica. Em geral, a prótese biológica em posição aórtica, na faixa etária entre 65 e 70 anos, tem uma durabilidade de cerca de 20 anos. Além disso, os riscos de medicação anticoagulante nesta faixa etária estão relacionados à incidência de hemorragia cerebral, em taxas maiores do que em pessoas jovens. Por isso, também, a opção pela válvula biológica – ainda lembrando que a idade não deve ser o único critério de escolha.

E na idade adulta?

Vamos analisar a situação de pessoas na faixa entre 50 e 65 anos. Na opção pela válvula mecânica, terão um longo período de medicação anticoagulante. Se optarem pela válvula biológica, terão nova cirurgia cardíaca pela frente. Por isso, esta tem sido uma questão amplamente estudada na Medicina. Alguns estudos nos Estados Unidos mostram que o uso de anticoagulantes a longo prazo tem maior risco do que uma nova cirurgia. Assim, se considerarmos que a primeira válvula biológica dure 15 anos e a segunda 20, esta pessoa de meia idade terá apenas uma reoperação na vida.

 

Como escolher entre válvula mecânica ou biológica?

Quem necessita de uma troca de válvula do coração se vê diante de dois caminhos. O primeiro, de enfrentar o risco da anticoagulação diária, afastando o temor de uma reoperação futura (optando por válvula mecânica). O segundo, de aceitar a possibilidade de vir a ser operado novamente, mas sem conviver os riscos da anticoagulação (optando por válvula biológica).

Este assunto é bastante controverso e até mesmo polêmico no meio médico. Por isso, é fundamental que a decisão seja realizada de forma bem consciente. Além disso, a tecnologia da Medicina vem evoluindo sempre. Recentemente, foi lançada a tecnologia Resilia, recurso que retarda o processo degenerativo de calcificação das próteses biológicas.

Assim, converse com seu Cardiologista Clínico e com o seu Cirurgião Cardiovascular e esclareça todas as suas dúvidas. Eles irão lhe orientar e definir, junto com você, a melhor escolha para o seu caso. Se tiver alguma dúvida, conte conosco!

 

Sobre o autor:

Este artigo foi escrito com base em entrevista com o Dr. Sergio Lima de Almeida (CRM 4370 / RQE 5893), cirurgião cardiovascular em Florianópolis/SC.

 

CTA-valvulas-cardiacas-tudo-o-que-voce-precisa-saber

 

Como controlar a dose do anticoagulante?

Como controlar a dose do anticoagulante?

Sempre que o sangue humano entra em contato com materiais ou superfícies diferentes da parede interna dos vasos sanguíneos, ele tende a coagular. O tecido sanguíneo, que antes era líquido, passa a assumir uma consistência gelatinosa. O que pode provocar obstruções graves nos vasos, levando a quadros como as Embolias e os Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC).

“Isso pode acontecer, por exemplo, em pacientes com problemas nas válvulas cardíacas. As insuficiências, estenoses e endocardites podem fazer com que o implante de uma prótese mecânica seja necessário. Essas, por sua vez, tendem a estimular a produção de coágulos. E é por isso que o uso de medicação anticoagulante é obrigatório nessas situações” – Dr. Guilherme Genovez, Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

Existem também os casos de pessoas com tendência genética para a formação de trombos e que adquirem essa condição ao longo da vida. Muitas vezes, o medicamento anticoagulante é prescrito como forma de tratamento e/ou prevenção.

Abaixo, o Dr. Guilherme Genovez (CRM 3798 / RQE 8599), Médico Hematologista e Diretor do Centro de Hematologia e Hemoterapia de Santa Catarina – HEMOSC – explica como são feitos e qual a importância dos exames para o controle da coagulação sanguínea em pacientes que fazem uso de medicação anticoagulante.

Prescrição

Existe hoje uma grande variedade de medicamentos anticoagulantes no mercado. Como principais, podemos citar as Heparinas, os novos anticoagulantes DOACs (Dabigatrana, Rivaroxabana, etc) e os cumarínicos (anti-vitamina k), como a Varfarina.

Cada medicamento possui uma recomendação própria. A prescrição deles deve ser feita apenas pelo médico responsável, de acordo com o problema de saúde do paciente.

“De acordo com a avaliação médica, os DOACs podem ser prescritos em situações como as Embolias Pulmonares, por exemplo. Uma das vantagens é que eles dispensam a realização de exames de coagulação sanguínea” – Dr. Guilherme Genovez, Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

No entanto, os DOACs não podem ser utilizados por pacientes com prótese valvar. Nestes casos, os medicamentos cumarínicos como a Varfarina são obrigatórios e exigem o controle periódico da coagulação sanguínea, chamado de Tempo de Ativação de Protrombina – TAP. Nele, os médicos irão avaliar o RNI – Relação Normatizada Internacional – do paciente.

RNI – Relação Normatizada Internacional

O primeiro ponto de devemos observar quanto ao uso de medicação anticoagulante como a Varfarina é que todo paciente possui características próprias, que precisam ser avaliadas e respeitadas. Uma dose benéfica para uma pessoa pode gerar grandes problemas para outra.

“Alguns pacientes devem ser submetidos a apenas 2,5mg de Varfarina a cada dois dias. Outros, necessitam de 15mg. A dose varia de paciente para paciente. E o índice que determina isso é o RNI – a Relação Normatizada Internacional” – Dr. Guilherme Genovez, Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

Além disso, as diferentes doenças exigem cuidados diferenciados. Assim, encontrar a dose ideal da medicação anticoagulante nem sempre é uma tarefa fácil.

“Doses baixas de medicação anticoagulante podem expor os pacientes ao risco de formação de coágulos. Já as doses muito elevadas aumentam os riscos de problemas como as hemorragias. Por isso o RNI é tão importante” – Dr. Guilherme Genovez, Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

Como é avaliado o RNI?

Para identificar qual a dose adequada de medicação anticoagulante para cada pessoa, são coletadas pequenas amostras de sangue. Nele, são adicionadas substâncias de origem animal ou humana que induzem a coagulação sanguínea.

Assim, os profissionais podem avaliar quanto tempo a mais o sangue do paciente leva para se coagular de acordo com a dose estabelecida do anticoagulante – e verificar se o paciente está ou não dentro da faixa terapêutica e de segurança.

“O grande problema tempos atrás é que cada substância reativa induzia a resultados específicos. O RNI é uma forma de padronizar esses resultados. Faz com que, independente da substância utilizada pelo laboratório, os resultados sejam padronizados e seguros” – Dr. Guilherme Genovez. Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

De forma geral, as faixas terapêuticas de RNI dos pacientes variam com o modelo da válvula utilizada:

  • Válvulas modernas: RNI 2 a 3.
  • Válvulas antigas: RNI 2,5 a 3,5.
  • Válvulas muito antigas (década de 60): RNI 3 a 4, dependendo da tecnologia usada.

Até mesmo o posicionamento da prótese pode interferir no RNI ideal. Geralmente, as próteses na posição mitral exigem um índice de RNI levemente maior do que as próteses na posição aórtica.

Periodicidade

Os pacientes com próteses valvares mecânicas devem realizar os exames para controle da coagulação por toda vida. Já os pacientes com próteses biológicas apenas nos três primeiros meses.

“Nos primeiros três meses, tanto os pacientes com próteses biológicas quanto mecânicas devem fazer um controle semanal da coagulação sanguínea” – Dr. Guilherme Genovez, Médico Hematologista (CRM 3798 / RQE 8599).

  • No período inicial, uma vez que o indivíduo apresente resultados estáveis em 3 exames consecutivos, a dose do medicamento anticoagulante é definida.
  • Após os 3 primeiros meses, o exame de coagulação passa a ser trimestral (dependendo da orientação do médico responsável).

Sobre o autor: Dr. Guilherme Genovez (CRM 3798 / RQE 8599), é médico Hematologista e Diretor do Centro de Hematologia e Hemoterapia de Santa Catarina – HEMOSC. Formado em medicina pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e com especialização em hematologia e hemoterapia, possui extenso currículo com contribuições à saúde pública catarinense, atuando por 13 anos como médico intensivista do Hospital Regional de São José. Em 2008, esteve à frente da Coordenadoria da Política Nacional de Sangue e Hemoderivados (CGSH/DAE/SAS) do Ministério da Saúde, em Brasília, onde ficou até 2014.

Banner verde-água com um médico e um enfermeiro, ao lado está escrito: "Aula: Prevenção de Doenças Cardiovasculares. Faça o download".