Eletrocardiograma
A convite da equipe de cirurgiões cardiovasculares da equipe Seu Cardio, o Prof. Dr. Miguel de Patta* (CRM/SC 2276 RQE 3308) explica o papel do Eletrocardiograma no diagnóstico das doenças do coração. Confira o post sobre o assunto:
O coração é uma bomba fantástica que recebe o sangue oxigenado nos pulmões e o envia para todo o corpo. Isso é bem conhecido por toda a população. No entanto, poucas pessoas sabem que essa bomba funciona à eletricidade e que essa eletricidade é gerada por ele próprio, através de células que a sua natureza criou para isso.
O eletrocardiograma que nada mais é do que o registro da atividade elétrica do coração. É um exame relativamente simples, rápido e barato. Surgiu há mais que 100 anos para auxiliar o médico no diagnóstico das várias doenças do coração, como também para trazer informações importantes sobre possíveis complicações dessas doenças.
Quando comenta-se que alguma pessoa está com “problema de coração”, alguns podem pensar que só existe um problema ou uma doença. Na verdade, existem várias formas de acometimento do coração:
- arritmias (coração descompassado);
- falta de sangue no próprio coração, por obstrução das coronárias (isquemia ou, quando mais grave, infarto);
- doenças nas válvulas que causam dilatação ou hipertrofia do coração (aumento da musculatura das paredes);
- doenças inflamatórias ou infecciosas que fazem o coração dilatar;
- doenças congênitas (a criança já nasce com o problema).
Como o eletrocardiograma ajuda no diagnóstico?
Arritmias:
Existem vários tipos de arritmias. Algumas mais preocupantes e outras “benignas”, que não exigem tratamento. Quando portadores de arritmias, os pacientes expressam suas queixas aos médicos de várias formas:
- “o meu coração disparou”;
- “o meu coração quer sair pela boca”;
- “o meu coração deu uma cambalhota”;
- o meu coração está descompassado”, etc.
De acordo com essas queixas o médico pode apenas suspeitar qual o tipo de arritmia está ocorrendo. Porém, o diagnóstico correto é feito pelo eletrocardiograma e, infelizmente, isso nem sempre é possível. Muitas vezes, a arritmia “já passou” e o eletrocardiograma pode ser normal.
Quando o cardiologista suspeita realmente de que as queixas do paciente são compatíveis com alguma arritmia, pode recorrer ao Eletrocardiograma de 24, 48, ou 72 horas, que chamamos de HOLTER.
Nos pacientes que desmaiam, se recuperam e procuram o médico após o episódio, a causa do desmaio pode, eventualmente, ter sido uma arritmia. Nesses casos, o diagnóstico do tipo de arritmia pode tornar-se difícil porque, geralmente, o eletrocardiograma não é realizado no momento do desmaio. Nessas situações, o HOLTER tem muita importância na procura e no esclarecimento da causa.
No decorrer de várias doenças graves, sejam elas do coração ou não, as arritmias podem aparecer e, às vezes, podem levar à morte. Por essa razão, os pacientes que estão internados na UTI estão sempre monitorizados , com seu eletrocardiograma sendo gravado e observado pelos médicos e enfermeiros durante 24h. Na eventualidade de uma arritmia, o diagnóstico é imediato, facilitando o tratamento quando necessário.
Infarto e Isquemia
O coração não para de trabalhar nunca, necessitando constantemente de um aporte de oxigênio para poder realizar esse trabalho adequadamente. Quem leva o oxigênio é o sangue, que caminha por canos que chamamos de artérias e veias. No coração esses canos são as coronárias.
Se uma ou mais coronárias estiverem obstruídas parcialmente, ou seja, algum sangue ainda passa, apesar da obstrução, o paciente poderá apresentar sintomas apenas durante o exercício, geralmente uma dor ou desconforto no peito causada por falta de sangue naquele momento do esforço. É o que chamamos de isquemia. Se o eletrocardiograma for realizado no momento da dor, a possibilidade de apresentar alterações é maior, facilitando o diagnóstico da doença Porém, se for realizado após a melhora do quadro, poderá ser normal e o médico não consegue descobrir o problema. Por isso, em pacientes que apresentam dor ou opressão no peito aos esforços e procuram o médico após o alívio dos sintomas, muitas vezes solicita-se um Teste de Esforço (teste de esteira) para tentar reproduzir, no consultório, aquela situação que causou o sintoma e observar as alterações no eletrocardiograma.
Se ocorrer uma oclusão súbita e total da coronária, ou seja, não passa mais sangue nenhum, a parte do coração que recebia sangue por essa coronária vai morrer. É o que chamamos de necrose ou infarto. Essa situação geralmente ocorre em repouso e o paciente começa a ter dor no peito de repente. Procurando a emergência rapidamente, na grande maioria das vezes, o eletrocardiograma mostrará os sinais de infarto, indicando que uma coronária “fechou” totalmente. Esses pacientes são encaminhados rapidamente para o cateterismo para desobstrução da coronária (angioplastia), muitas vezes com a colocação de um stent. Essa é uma situação em que o Eletrocardiograma é extremamente importante, porque além de fazer o diagnóstico do infarto, orienta o cardiologista para qual o melhor tipo de tratamento.
Doença nas Válvulas Cardíacas:
O coração possui 4 válvulas que abrem-se deixando o sangue passar e fecham-se impedindo o sangue de voltar. Se uma dessas válvulas não abre-se bem, isso exigirá do coração um trabalho maior para fazer a mesma quantidade de sangue passar pela válvula estreitada. As paredes do coração “fazendo mais exercício” vão ficar mais musculosas, o que chamamos de hipertrofia. Se porventura a válvula torna-se insuficiente, o sangue vai voltar para o local de onde veio. Isso levará à dilatação do coração. Ambas as situações, hipertrofia ou dilatação, poderão ser diagnosticadas pelo eletrocardiograma, ajudando o cardiologista a descobrir que o problema na válvula é importante.
Pressão Alta (Hipertensão Arterial):
Essa é uma situação bem comum na população. Se o paciente tem pressão muito alta e não faz tratamento adequadamente para controlá-la, o coração terá que fazer mais força para mandar o sangue contra essa pressão alta. Isso também exigirá um trabalho maior que, para ser realizado adequadamente, necessitará que o coração aumente a sua massa muscular – a hipertrofia. Como já comentamos acima, essa hipertrofia poderá ser diagnosticada pelo eletrocardiograma.
Assim, o médico poderá saber que a pressão alta está repercutindo sobre o coração e se essa repercussão é importante ou não. Isso alertará o médico para a necessidade de um controle adequado da pressão com um, dois ou mais medicamentos.
Se o paciente apresenta uma hipertensão leve ou moderada, mas bem controlada com os remédios, a hipertrofia não aparecerá no eletrocardiograma. Isso tranquilizará o médico, pois o coração não foi afetado.
De uma maneira geral, essas são as situações mais frequentes na nossa prática diária em que o Eletrocardiograma ajuda o cardiologista no diagnóstico das doenças do coração. Além disso, muitas vezes o orienta quanto à necessidade não só de tratamento, mas também do tipo de tratamento. Por isso na consulta com um cardiologista, o paciente sempre deverá realizar um eletrocardiograma.
*Autor: Prof. Dr. Miguel de Patta (CRM/SC 2276 RQE 3308), Cardiologista na clínica Unicardio, em Florianópolis/SC, e professor de Cardiologia na Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL).